domingo, 5 de maio de 2013

Colors of Silence

por M. Deméter


Mais um post com o tema do Céu Literário. O tema agora é silêncio.
Agradeço aos comentários e quem gosta dos contos, fique a vontade pra seguir o blog, estou me esforçando para fazer posts semanais agora. (:
Obrigada.


Estou afundando nesse silêncio
Silence – Sarah Mclachlain

“Os olhos dela refletiam todas aquelas cores que preenchiam o mundo.” – foi o que passou em minha mente a primeira vez que a vi depois de tudo.
No começo não ousei me aproximar, ela parecia nervosa demais para me perceber ali parado, observando. E eu não queria que o fizesse. Não estava preparado para aquele contato, não saberia como reagir, como assimilar o que ela falaria.
Contudo, ao mesmo tempo, sentia sua falta. Foram longos os dias no hospital sem suas visitas. Visitas que eu mesmo implorei que ela não fizesse. Aquele era um momento apenas meu.
Eu fora internado alguns dias antes para uma cirurgia que poderia me deixar viver por muitos anos, mas que ao mesmo tempo seria responsável por me fazer mergulhar num mundo totalmente silencioso.

— É preciso dissecar seu tumor, a cirurgia pode causar efeitos colaterais graves, já que ele está localizado na região responsável pela audição. – foi o que o médico explicara.

Eu havia descoberto um tumor no cérebro, não era muito grande, mas estava numa região complicada, segundo o neurologista. Segui o conselho do doutor, e exatamente como ele explicou, houve danos colaterais.
Acordei sem escutar absolutamente nada.
O mundo parecia estar no mute, como se o problema não fosse com minha audição, mas sim com os sons. Senti que eram eles que não queriam se pronunciar ao meu redor, e não meus ouvidos que não conseguiam escutá-los.
E agora lá estava eu, em vez de me preocupar com todos os anos que eu teria para viver, com toda a dificuldade que teria para aprender a conviver com aquele silêncio interminável. Preocupava-me apenas com ela, e em como ela encararia aquilo, em como conseguiria conviver com aquilo.
Não suportaria perdê-la também, não depois de perder os sons.
Entretanto, eu entenderia caso assim sucedesse, afinal, ninguém é obrigado a conviver com isso, a não ser, é claro, o próprio portador da deficiência.
O braço dela foi até o rosto, mexeu numa mecha do cabelo escuro. Notei suas pernas revezando no apoio do corpo, dobrava um joelho, esticava o outro. Trocava alguns segundos depois. Não contive o riso – riso sem som, apenas uma vibração por dentro da garganta – ao perceber tal ato, nunca havia reparado antes.
Era realmente como diziam, todos os outros sentidos ficavam apurados com a falta de um? Não exatamente, acredito que até ficariam, mas só depois de algum tempo. A diferença era que agora eu não prestava mais atenção aos sons e então, à distância, tudo que sobrava era a visão.
Porém, fosse pela percepção visual, fosse pela auditiva, ela finalmente olhou em minha direção. Olhou e viu.
Senti minhas mãos geladas.
Percebi a mudança de expressão em seu rosto. Os lábios se contraíram num primeiro momento, para depois se tornarem um sorriso não tão natural. Os olhos percorreram o espaço ao redor, mais uma vez roubando todas as cores do mundo para dentro deles, e mandando-as de volta através do reflexo.
Aqueles olhos eram fascinantes, muito mais do que eu havia reparado antes. Tão vivos. Tão cheios de cor.
As pernas tomaram um rumo, seguindo o caminho que levariam até mim. Meus olhos percorreram sua pele até os pés: ela estava de salto. Era estranho não ouvir o toc toc familiar que eles faziam ao tocar o solo.
Era estranho não ouvir o vento que balançava sua saia e seus cabelos. Era estranho que as cores chamassem tanta atenção e que os detalhes de sua movimentação fossem tão perceptíveis.
Ela me abraçou. Sua pele estava agradável, nem muito quente, nem muito fria. Combinava bem com meus dedos gelados. Apertou seu corpo conta o meu e pude sentir uma lágrima molhando meu pescoço.
Afastou o corpo um instante depois e abriu um sorriso.
Percebi um movimento em seu tórax, achei que era uma daquelas inspirações fundas, seguidas de um suspiro que não podia ouvir. O braço subiu mais uma vez arrumando uma mecha de cabelo para trás da orelha.
Parou com as mãos na altura do peito.

“Eu te amo.” – seus gestos me disseram, enquanto uma lágrima escapava dos olhos. – “Para sempre.”

Quase consegui ouvir sua voz pronunciando aquelas palavras. Quase.
Eu não a perdera afinal.




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2 comentários:

  1. Simplesmente lindo
    devo ter escrito isso em meia dúzia dos seus textos.
    mas continua sincero.

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  2. Que lindo e triste, coisonga e e e e ><
    Gostado. <3

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