Este texto foi escrito em Junho de 2011, para o desafio Dia dos Namorados.
Agradecimentos: A
Lisa e a Bis, que me ajudaram com suas opiniões.
Minhas mãos corriam pelas páginas
e fotos do álbum preservado por tanto tempo, o álbum que relembrava todos os
momentos importantes da minha vida, desde meu nascimento, até a fase em que me
encontrava agora, a velhice. Mas a pergunta que não queria sair da minha mente
era apenas uma: Por quê?
Por que eu abria aquele álbum? Por
que eu insistia em encarar aquelas fotos? Por que sempre as mesmas fotografias? Por que sempre aquelas mesmas memórias? Por que sempre as mesmas lembranças?
Talvez fosse apenas por puro masoquismo,
e essa resposta já fora considerada pela minha mente várias e várias vezes. Mas
o que importava realmente a resposta? O fato é que meus olhos não podiam desviar
de uma seção do álbum, aquela que tinha as nossas fotografias.
O fato é que eu realmente sentia
sua falta.
Não se esqueça que é impossível deter uma lembrança quando ela aparece
em sua mente, e mais difícil ainda quando você procura por ela.
Ainda me lembrava, como se fosse
ontem, como se minha frágil memória idosa não aceitasse apagar um dia tão
importante como aquele doze de junho. Um triste dia dos namorados, o mais
triste de toda minha vida.
Iríamos completar quatro anos
juntos naquela data, e eu tinha uma notícia tão importante para compartilhar,
estávamos noivos e nosso casamento era dali a alguns meses apenas. Estava tão
feliz.
Meu ventre carregava agora a sua semente.
Andava apressada, havia uma rua
para atravessar antes da praça onde marcamos – você estava lá, olhando para os
lados me procurando – e eu não sei se foi um descuido, ou apenas o destino e
suas tramóias, mas quando meus passos me levaram ao meio do asfalto, a única
coisa que consegui ouvir, antes de perder seu rosto para a escuridão, foi uma
freada violenta.
E então o baque. O choque. O
carro contra meu corpo.
Ah, não, lembranças não podem simplesmente serem apagadas com uma
borracha, às vezes elas são permanentes.
Talvez sem aquele acontecimento,
meu álbum agora poderia conter outras lembranças, quem sabe uma foto como a
primeira, onde aparecia minha mãe segurando o meu eu recém-nascido. Talvez eu
também tivesse uma foto segurando um bebe, o meu bebe.
Uma lágrima marcou o álbum.
Memórias na maioria das vezes são escritas a caneta, e na vida real,
infelizmente, não existe corretivo.
Acordei no quarto claro do
hospital, você me encarava com os olhos vermelhos. Deduzi na hora, você estava
chorando, minha mão correu até meu ventre. Eu sabia que não havia mais nada
ali.
Eu estava vazia.
Não conseguia entender como
poderia sentir tanta falta de algo que nunca nem cheguei a conhecer, tudo
parecia ter sido apenas um sonho, era como se nunca tivesse existido nenhuma
criança, mas ao mesmo tempo, como se perdesse a coisa mais preciosa que
possuía.
Você me abraçou forte e senti
suas lágrimas molhando minha roupa. Aquele era um momento só nosso e ninguém
poderia aliviar nossa dor.
Fatos tristes, fatos felizes, são eles que moldam nossas vidas.
E mesmo agora, depois de tantos
anos, eu ainda sentia falta daquela criança.
Várias pessoas me perguntavam se eu
estava bem, sempre concordava dizendo que sim, que não poderia sentir falta de
uma coisa que nunca nem chegou a existir, mas era apenas uma mentira, eu sentia
falta dela mais do que de qualquer coisa.
E pensando agora, talvez o que me
fizesse falta na verdade, fosse o fato de ter me tornado estéril depois do
acidente, ter perdido a única oportunidade que tinha para ser mãe.
Então a sua mão apareceu ao meu
lado, fechou o álbum e colocou-o de lado, você se ajoelhou de frente para mim e
me abraçou forte. E pelo menos isso eu ainda possuía, você. Mesmo sem filhos,
pelo menos nosso casamento fora eterno.
Lembranças marcantes são apenas eternas, desista de esquecer.
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