Este texto foi escrito em Março de 2011, para o desafio Amor e Violência, no qual foi
classificado em 2° lugar. O trecho em italico no final, o mesmo que está na imagem, é de Oswald de Andrade.
Agradecimentos: Queria
agradecer muito, mais do que as palavras podem expressar, a Dora, minha querida
amiga campineira (morram de inveja), sem ela não conseguiria terminar esse
texto. E também a Anna, que não me deixou desistir. Obrigada.
Abri os olhos, estava numa sala pequena,
escura, e silenciosa, um cheiro fétido invadia minhas narinas, sentia meus
pulsos amarrados, o nó machucando minha pele.
Mas tudo que conseguia pensar era
nele, naquele homem puro e meigo que já não via há muito tempo, naquele homem
que na verdade não existia, que na verdade era apenas uma mentira, apenas um
teatro.
O amor pode
ser pureza
O amor pode
ser veneno
Sem certo
Sem errado
Eu pude vê-lo sentado no outro
canto da sala, somente como um vulto, ou talvez, mais como uma sombra, a minha
sombra, que estaria sempre ao meu encalço, não importando o que eu fizesse.
Desde o momento em que senti o
cheiro de éter¹ e uma mão apertando o tecido úmido contra meu rosto, sabia que
só poderia ser Cole², sabia que ninguém mais teria motivos para tal, e o pior
de tudo, sabia que sua fixação não acabaria por ali.
O amor pode
ser real
O amor pode
ser ilusório
Sem
tempestades
Sem calmarias
Meus pensamentos se perderam
quando ouvi seus passos, e antes que pudesse pensar no que fazer, ele já estava
ao meu lado, seus dedos seguraram meu rosto fazendo-me olhar para ele.
– Eu lhe avisei querida, que
antes de ser de qualquer um, seria apenas minha – sua voz possuía um tom
ameaçador, como era esperado.
– Você desperdiçou sua
oportunidade, sabe disso – retruquei.
Por apenas um instante seus dedos
soltaram meu rosto, e ao perceber o motivo, encolhi-me como instinto, por medo,
e sua mão acertou meu rosto com força, fazendo um gemido de dor escapar por
meus lábios, e provavelmente, causando prazer no agressor.
– Quieta, ainda não dei permissão
para que fale.
O amor pode
ser pacífico
O amor pode
ser violento
Sem prisão
Sem liberdade
Calei-me. Ainda não conseguia
entender como pude ser tão ingênua, como pude acreditar em toda aquela conversa
digna de um príncipe encantado, como pude me deixar levar por suas palavras em
tão pouco tempo.
O que mais me doía não era o
rosto, nem os pulsos, mas sim o peito, o coração, no fundo, é claro que,
talvez, eu ainda possuísse algum sentimento por aquele homem, que na verdade
era um monstro, um psicopata.
– Eu te trouxe aqui para dar-lhe
a chance de voltar atrás, querida.
Segui sua mão com o olhar, indo
ao bolso do casaco escuro que usava, e ao sair de lá, trazer consigo uma
caixinha aveludada, que eu já tinha visto em suas mãos.
– Sabe muito bem o que é isso,
não sabe?
Confirmei com a cabeça, dentro
daquela pequena caixa, certamente se encontrava a aliança que estava me
oferecendo quando meu pai chegou me contando a verdadeira história de Cole, um
assassino, um golpista, um psicopata.
O amor pode
ser honesto
O amor pode
ser indigno
Sem traições
Sem promessas
– Vou perguntar da forma correta,
como não fui capaz de fazer naquela tarde.
Fechei meus olhos, respirei
fundo, se era isso que ele queria, não haveria saída, nunca aceitaria me casar
com aquele mentiroso, e conhecendo, agora, seu passado, supunha que minha única
saída seria a morte.
– Olhe para mim – ordenou calmo.
Abri os olhos, e pacientemente,
olhei para os dele, esperando minha sentença.
– Aceita se casar comigo?
– Claro que não, você deveria
saber qual é a resposta, depois de todas as mentiras que inventou.
– Se não for minha, não será de
mais ninguém.
O amor pode
ser magnífico
O amor pode
ser assustador
Sem mentiras
Sem verdades
– A morte seria uma companhia
melhor que a sua – respondi com frieza.
Percebi seus olhos se fechando,
com o reflexo de uma pequena lágrima, e em seguida, eles se abrindo, apenas com
o ódio.
– Se é essa sua palavra final.
Ele puxou minha mão de forma rude,
fazendo-me gritar ao sentir a corda raspando contra minha pele, e contra minha
vontade, colocou o anel em meu dedo.
O amor pode
ser gentil
O amor pode
ser rancoroso
Sem morte
Sem vida
Senti sua mão puxando meu cabelo
agressivamente, levando meu rosto a quase encostar ao seu. Sua respiração,
antes calma, agora era quase hostil, gritei, mas minha voz foi interrompida por
um beijo forçado.
– Mas morrerá como minha. Para
que todos saibam, que foi apenas minha – pontuou ao libertar meus lábios.
Depois disso, perdi a conta de
quantas vezes sua mão tocou minha pele, de quantas vezes o sangue escorreu por
sua culpa, de quantas vezes meus músculos se enrijeceram, de como tive medo.
E naquele momento, tive certeza,
do que no fundo já sabia, aquele era meu fim.
Como poucos, eu conheci as lutas e as tempestades. Como poucos, eu amei
a palavra liberdade e por ela briguei.
Mas, infelizmente, no meu caso, não
havia como encontrá-la.
¹ Quando se coloca éter num
tecido e cheira por aproximadamente 15 segundos, a pessoa que inalou desmaia. É
bem comum ver cenas assim em filmes ou novelas.
² Segundo o Google minhas
pesquisas, Cole significa negro, carvão, pedra.
A-M-E-I
ResponderExcluirNao sabia que vc escrevia coisas tao... empolgantes como essas, divino mara
Simplismente magnifico.